Obras artísticas relembram o Massacre de Eldorado dos Carajás

A política e a transformação social do Brasil estão no centro do trabalho da companhia de teatro Estudo de Cena, que está em cartaz em São Paulo com o espetáculo Utopia da Memória, baseado nos históricos de lutas e resistências dos movimentos populares e forças progressistas do Brasil, como o massacre dos trabalhadores rurais sem-terra em Eldorado dos Carajás, ocorrido nesse município do Pará, em 17 de abril de 1996.

A peça também relembra as lutas dos movimentos populares por direitos em uma série de episódios históricos, intitulados: Canudos, Cangaços, Cicatriz, Espaços do Lembrar, Rastro Vermelho, Mariana, Carandiru, Campos de Batalha e Barricadas do Amanhã.

Tendo como eixo o resgate das lutas populares, a primeira obra do grupo foi a peça A Farsa da Justiça Burguesa, de 2012, uma versão da peça-procissão do MST sobre a luta pela terra, de 2005. O texto fez grande sucesso por todo o Brasil, encenado também por outros grupos, dando origem a uma websérie de 21 capítulos sobre a experiência de vida da companhia e o contato deles com a luta contra os latifúndios no Brasil.

Nesta quarta-feira (17), dia de relembrar o Massacre de Eldorado dos Carajás, a companhia Estudo de Cena apresenta ao público o filme A farsa: ensaio sobre a verdade e a peça Utopia da Memória.

As atividades acontecem na Oficina Cultural Oswald de Andrade, no Bom Retiro, um dos espaços ameaçados de fechar as portas com o corte no orçamento da cultura assinado pelo governador João Dória (PSDB).

  Confira trechos da entrevista com o diretor da companhia, Diogo Noventa.

Brasil de Fato: Como o grupo Estudo de Cena se aproximou da luta pela terra e dos movimentos populares, e como isso se relaciona com a arte?

Diogo Noventa: Nas primeiras ações do Estudo de Cena, antes de virar companhia de teatro, a gente já tinha uma relação com o MST por conta de objetivos políticos e estéticos em comum. O encontro, no início, se dá pelo entendimento de uma luta em comum pelo direito à terra e uma luta comum contra os latifúndios dos universos simbólicos, os latifúndios da Indústria Cultural.

                           E o que marca esse encontro de lutas?

A gente é um grupo que busca uma reflexão crítica e estética sobre as condições atuais da vida e aí a questão da terra é estruturante. E o MST é um movimento que pesquisa e dá relevância à questão da cultura e da arte. Essas duas pautas são o encontro, que o discurso hegemônico tende a dissociar – arte e política –, mas a gente sabe que estão juntas e a gente se junta neste sentido.

         Qual é a história da criação da peça A Farsa da Justiça Burguesa?

Em 2012, o grupo assumiu a responsabilidade de montar a peça que faz parte de um momento histórico do movimento. Em 2005, ela foi criada como peça-procissão para fazer parte da Marcha do MST até Brasília. Ao fazer A Farsa a gente faz uma discussão contemporânea sobre o direito à terra, juntando com a violação dos direitos da população da cidade.

A nossa versão de A Farsa junta a questão do campo e da cidade, porque em princípio a gente monta a peça e apresenta nas ruas da cidade de São Paulo. Depois, a gente apresenta a peça para os espaços do MST e do MTST [Movimento dos Trabalhadores Sem Teto] também, em universidades e diversos locais de organização de trabalhadores.

A partir de A Farsa, o grupo assume uma característica política e consegue juntar diversas pautas e reivindicações contra-hegemônicas.

Vocês também têm um trabalho com o Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM) dando oficinas de teatro. Como funciona essa parceria?

Essa aproximação começou em 2017, e é um processo que vai alimentando toda a criação do espetáculo Utopia da Memória. Nas oficinas, que aconteceram na ENFF [Escola Nacional Florestan Fernandes], foi produzida a peça-estudo que o MAM passa a replicar em várias lugares. A música da peça acaba virando uma música de reivindicação do movimento. O tema mineração passa então a impactar muito forte o Estudo de Cena.

A gente já tinha o tema da terra e disputa pela terra, a gente já tinha o tema da violência urbana e da violência do Estado. Com o MAM, o tema da exploração mineral e das consequências da exploração via empresas internacionais e projetos do governo brasileiro entram no nosso repertório, correlacionando com as demais questões.

Juca Guimarães / www.brasildefato.com.br

 

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